Cartas a meu filho, 1: o significado do mundo

Posted on fevereiro 5, 2016

0


Decidi escrever algumas cartas a meu filho. Não sei se ainda vai existir a web como a conhecemos quando ele puder ler isso. Espero que sim. Mas as cartas também são lembretes para mim, de itens que eu não posso esquecer de trabalhar com Matias (meu filho, que ainda brinca na barriga da mamãe). Podem ser úteis para você também.

* * *

Filho, o mundo não é plano. Talvez você já esteja aprendendo isso nas aulas de geografia. Mas não é disso que eu falo. Embora os seus professores ensinem que a Terra não é achatada, na prática, eles achatam o seu mundo. Não só eles, é verdade — até na igreja há quem contribua para isso.

Mas eu repito, filho: o mundo não é achatado. Você lembra das histórias que eu contei? — Sobre dragões e fadas, sobre monstros e heróis, sobre orcs e elfos? Lembra das árvores que falavam, e do mundo acessado pelo guarda-roupas? Lembra de Aslam e do sr. Tumnus? Lembra de Hermes, Prometeu, Narciso e Sísifo? O que eles tinham em comum?

Nenhum deles se esgotava nessa realidade, filho. Eles só podiam ser vistos e compreendidos com as portas da imaginação bem abertas. Talvez ao fechar os olhos você enxergasse melhor. Viu de perto as batalhas entre os Vingadores e a turma de Ultron! Dava para ouvir o cântico de Aslam, não é verdade?

A capacidade de ver além da realidade imediata não funciona apenas para essas histórias. Era importante que você conseguisse enxergar o que os seus professores, com a retórica científica, não permitem vislumbrar.

Agora abra os olhos, mas abra bastante! Veja o mundo! Olhe as nuvens e suas formas; os tons de verde nas folhas; toque a textura das árvores; descubra qual o prédio mais alto à sua volta. Tudo isso aponta para uma realidade mais profunda.

Como assim? — você pode perguntar. Eu respondo com a Bíblia:

Os céus declaram a glória de Deus;
o firmamento proclama a obra das suas mãos.
Um dia fala disso a outro dia;
uma noite o revela a outra noite.
Sem discurso nem palavras,
não se ouve a sua voz.
Mas a sua voz ressoa por toda a terra,
e as suas palavras, até os confins do mundo

(Salmos 19.1-4, NVI)

Enquanto você aprecia as cores e os sons desse mundo, perceba o que está além. Esse mundo não é achatado! Existe significado para além dele. Cada nuvem revela a grandiosidade de Deus; cada gota de chuva aponta para a provisão e cuidado do Senhor; cada flor delicada e colorida manifesta a criatividade do Criador; cada sólida montanha anuncia a força do Altíssimo.

Veja como Rubens nos ajuda a ver o mundo além do que está diante dos olhos. A vida comum, a luz sobre a cidade, o arco-íris... Tudo tem uma razão de ser. (Landscape with a rainbow, 1630-1635)
Veja como Rubens nos ajuda a ver o mundo além do que está diante dos olhos. A vida comum, a luz sobre a cidade, o arco-íris… Tudo tem uma razão de ser. (Landscape with a rainbow, 1630-1635)
Os prédios que você vê falam da criatividade e inteligência que os homens herdaram de Deus. E cada casal com uma aliança no dedo fala do relacionamento amoroso que o Senhor vive com a Sua noiva – a igreja.

Olhe para o mundo, filho! Ele é rico de significado. Até as coisas feias, como a morte, as doenças e os conflitos entre pessoas revelam quem somos, e como precisamos de um redentor.

O significado do mundo não é uma equação para resolver. Não transforme isso em um exercício intelectual. Certamente a sua racionalidade faz parte do processo, mas lembre-se que a razão somente não permitiria que você ouvisse o Barbárvore (árvores falam?). Para ouvir as nuvens e os pássaros em seu cântico de adoração, use a razão, mas não somente ela. Seja amigo da imaginação. O ponto não é apenas “decifrar” o código do mundo, mas se maravilhar com ele. O ponto é preservar esse senso de admiração, e converter isso em adoração. O significado do mundo é a grandeza de Deus revelada, para que eu e você nos curvamos diante dEle.

Por vezes tentarão roubar isso de você. Dirão que só importa o mundo observável. Separarão o símbolo da realidade. Dirão que só confie nas proposições. Nessas horas, lembre-se do discurso sem palavras que um dia faz a outro dia. E, se precisar, para enxergar mais longe, feche os olhos.
Posted in: a Bíblia, a Caneta