Sempre fui fã de fones de ouvido. Antes de eu conseguir comprar algum de qualidade, já desejava ter nos ouvidos um som fiel. Uma vez que comprei um bom, passei a investigar características e modelos, “namorando” alguns na vitrine das lojas, sonhando com outros, e vivendo em busca do fone perfeito. Virei piada em casa – minha esposa até hoje não entende o fascínio que tais dispositivos exercem sobre mim. Talvez, se ela visualizasse a cena de chegar em casa após um dia cansativo e “pausar” o mundo ao colocar os fones com uma boa e relaxante música, ficaria mais fácil de entender. Os fones nos conectam e desconectam da realidade.
E eu, que amava os fones, hoje me vejo sem nenhum interesse de usá-los. Loucura? Homem de fases? Nem tanto. Permita-me explicar:
Há duas semanas o meu filho nasceu. Seu nome é Matias. Desde que Matias chegou, os fones de ouvido são matéria desinteressante para mim. Não em si – eu ainda adoraria passar algum tempo lendo e conhecendo novos modelos -, mas no contexto. Há duas semanas eu sou atenção. Há duas semanas não quero “pausar” o mundo. Há duas semanas apenas um som me interessa: os gemidos e o choro do meu pequeno. Fones, agora, seriam empecilhos para ouvir a sua voz. Fora com eles.
A ironia dessa mudança me faz pensar sobre o relacionamento que temos com Deus. A Bíblia não hesita em usar a figura da paternidade para descrever a maneira como Deus se relaciona conosco. Na oração do Senhor, a recomendação de Jesus é que nos voltemos para Deus afirmando “Pai nosso” (Mateus 6.9). Como um pai bondoso, o Senhor está pronto a nos ouvir. No mesmo contexto de Mateus 6, por duas vezes é afirmado que o Pai nos vê em secreto, no ambiente de intimidade. Devemos buscar ao Senhor, pois Ele está atento à nossa voz.
Não sei o quão profunda ou teológica pode soar essa afirmação, mas é significativa: Deus não usa fones de ouvido. Ele é atenção e amor, é cuidado e graça. Ele olha e zela por Seus filhos como nenhum pai terreno consegue.
Isso é grande fonte de esperança. A quem você clama no meio da crise? Para quem você chora? Alguns têm que lidar com um profundo senso de abandono e isolamento no mundo. Lançados em um espaço sem propósito e significado, em um mundo sem inteligência e intencionalidade, tais pessoas se vêem sozinhas. Escravas de seu narcisismo, não lhes resta uma realidade externa, e nem um “outro” a quem possam se voltar.
Mas o outro não pode ser apenas um ouvinte passivo e comum. Que esperança há para o homem com o carro quebrado que chora sua crise para um nutricionista? Este pode ser um bom ouvinte, mas nunca lidará com o dilema real. O homem solto no mundo não precisa apenas de um ouvinte, mas de alguém que trate o seu problema. A questão fundamental do homem está em seu coração. A crise de todas as crises repousa lá dentro.
Felizmente, há um Pai que não apenas ouve, como tem toda a capacidade de lidar com as nossas crises. Não somente tem a capacidade, como tem o desejo de cuidar dos Seus filhos. Faz todo sentido chorar em direção a Ele.
O Pai bondoso está sempre atento, graciosamente ouvindo o nosso choro e providenciando paz diante da aflição.
Ronaldo Pinto
maio 5, 2016
Sensacional a intensidade que se retrata aqui da paternidade. Essa coisa de ter alguém indefeso como dependente é surreal. Mexe com tudo na vida da gente. O senhor pastor Allen foi minha voz aqui e a de muitos outros jovens pais por aí que sentem o mesmo, só que de formas e situações distintas. Deus continue lhe abençoando grandemente.